Novo Jornalismo propõe informação e notícia além do lead

julho 24, 2009


Tudo na rua pode ser uma pauta. Mas, nem por isso, esse "tudo" pode virar uma notícia. Essa semana, após terminar a reunião de pauta da revista da qual trabalho, me ocorreu essa constatação. Numa série de coisas que acontecem no mundo, o que realmente é interessante, a ponto de poder repercutir como história para o público? Depende da linha editorial e do objetivo do veículo de comunicação em questão. Principalmente, dos assuntos que precisam ser investigados com mais profundidade na sociedade ou que ainda não foram tocados pelos outros colegas da imprensa. Atividade esta que não é nada simples e que exige ética, conhecimento científico em Comunicação, técnica jornalística, responsabilidade e compromisso com a verdade.

Desde pequeno gosto de ouvir boas histórias. Sou bom ouvinte e leio de tudo. Hoje, como jornalista e repórter, sempre que me deparo com uma fonte bem articulada ou que possui uma boa história para contar, tenho vontade de fazer uma matéria apenas com esse personagem. Já tive a oportunidade de fazer isso. Não se trata de um perfil, nem de promoção pessoal do entrevistado, nem de matéria paga. Nada disso.


O jornalismo tem como matéria-prima a vida real. E nessa realidade há várias histórias - outras boas e algumas tristes, mas que mereçam ser divididas com o público. Dois exemplos que me marcaram muito como repórter, nesse um ano de Revista Diário de Bordo, foram a matéria sobre Desaparecidos, na qual inclusive lancei o projeto aqui no blog, Café Cidadão, onde divulgava fotos de pessoas desaparecidas. Nesta matéria tive a oportunidade de contar a história da empresária de classe média alta Fabiana (nome fictício), que aos 36 anos, faz o caminho inverso de muitas pessoas que procuram entes queridos desaparecidos: ela procura os seus pais biológicos. Segundo consta nos autos da Polícia Civil de Minas Gerais, a mãe de criação dela teria supostamente roubado ela quando bebê e a criado como sua filha legítima.

Mesmo com o forte apelo que o caso poderia ter se ela procurasse um emissora de TV, por exemplo, Fabiana aceitou conversar comigo com exclusividade e dividir detalhes da sua intimidade familiar. A matéria chegou a ter uma boa repercussão na época. Mas, mesmo assim, Fabiana continuou firme e disse que não daria entrevista para mais ninguém, apenas para mim. Esta confiança que tenho com a fonte não tem preço e foi galgada com meses de entrevista. Não foi de um dia para o outro. Infelizmente, Fabiana ainda procura pelos pais biológicos.

Ainda não publiquei essa matéria no Café com Notícias, pois pretendo usá-la em agosto, para comemorar os dois anos do blog, pois tem muita história de bastidores dessa resportagem em si que quero dividir com você, que lê este espaço e que acompanha meu trabalho há algum tempo. Ah, além disso, em agosto estréia o novo layout do Café, mais moderno e clean: aguardem!


Pois bem, a outra matéria - que foi mais tranquila, mas no qual aprendi muito como ser humano, além de ter tido a oportunidade de fazer um amigo, foi a reportagem que fiz com o jornalista e radialista Humberto Araújo, que por ser um apaixonado por animais, deixou de lado a profissão, para ser adestrador e consultor de animais de estimação, aqui em Belo Horizonte (MG). Humberto, depois de anos, conseguiu realizar o seu sonho e trabalhar apenas com aquilo que gosta. O trabalho dele é muito parecido com o que faz o Dr. Pet, no programa "Domingo Espetacular", da Rede Record.

Sou uma pessoa apaixonada por animais. Além disso, gosto de boas histórias, como já disse. E Humberto é do tipo de pessoa que há troca de conhecimento constante no bate-papo e que agrega conhecimento. E, por ter uma história tão boa, não tive como não colocá-lo como foco principal da matéria. Em breve, para quem não teve a oportunidade de ler a última edição da Revista Diário de Bordo (maio/2009), poderá acompanhar, em agosto, esta reportagem na íntegra e também os bastidores, aqui no Especial de 2 ANOS do Café com Notícias.


Mas, esses meus dois exemplos de personagens que renderam boas reportagens, serviram de pano de fundo para falar do mestre mor do Novo Jornalismo e/ou Jornalismo Literário: o jornalista e escritor norte-americano Gay Talese, que sabe como ninguém explorar um personagem e mostrar que uma história não é só um lead, mas pode ser um aprendizado para a vida toda. Vasculhando na internet, achei duas entrevistas ótimas de Talese, que aos 77 anos, gosta de ter o tempo que for preciso para ir a fundo nas suas pautas e transformá-las em reportagens. Se você não o conhece, vale a pena ler e se deliciar com este aprendizado em forma de entrevista.

Nesse primeiro ano de vida da Revista Diário de Bordo, a veiculação dela era trimestral, apesar de ser uma revista de variedades e segmentada para o público A e B. Tinha aproximadamente dois meses para cumprir cada pauta. Com esse tempo, aproveitava para ir a fundo na reportagem e investir em apuração. Fiz trabalhos que me emocionaram - não só pelo resultado final, mas pela oportunidade de aprender muito sobre a realidade de cada personagem que entrevistei. Agora, a revista mudou de nome. A periodicidade, a partir do próximo mês, é mensal. Em breve, será anunciada este novo projeto pioneiro que fico feliz de poder fazer parte. Ainda não posso falar o novo nome da Revista, mas espero dividir com você todo esse momento de reestreia.

O ritmo de trabalho aumentou. E, com isso, a oportunidade de me dedicar a cada pauta ou personagem, diminuiu. Queria poder ter mais tempo para aprofundar. Mas, nem por isso, deixarei de trazer esse diferencial para o leitor, pois o bacana de ser repórter de revista é saber que é possivel ir além da notícia e mostrar que existe diálogo entre o texto e quem lê. O desafio de ser mensal me anima! Peço licença poética ao pegar para mim essa definição que Gay Talese deu à profissão de jornalista, em entrevista ao Estadão, que explica muito bem o ofício: "sou um historiador de pessoas que não têm história registrada em público".





Essa semana eu volto com mais Café com Notícias.






Wander Veroni
Jornalista

MAIS CAFÉ, POR FAVOR!

24 comentários

  1. Wander, bacana o post... gostei!!
    Ah! tem mais selos para vc lá no blog... tem tempos que não venho por aqui, mas nao me esquici de vc! rsrsr

    vamos trocar informação!!!!

    bjos

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  2. Olá Wander, como vai? Tava devendo umas visitas por aqui...hehehe

    Isso é que dá gosto de ver num jornalista de verdade: ética. Quantos por aí exploram a tragédia alheia atropelando os sentimentos dos envolvidos - tudo em prol da sua promoção pessoal.

    Ainda bem que existem jornalistas como vc que tem essa noção do que realmente pode se tornar noticia sem ser apelativo e respeitando os entrevistados e o publico que lê.

    Parabéns!!!

    Abçs!!!

    Qdo puder, venha Delirar comigo...

    http://blogpontotres.blogspot.com/

    Delírio - Ódio

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  3. A profissão de jornalista é ingrata. A "pauta" de uma publicação não envolve só ética e técnica. Envolve primeiro interesses dos patrocinadores e dos "aliados" do grupo editorial. Depois vem a técnica e a ética fica por último sendo seguida sempre que possível.

    É como deve se sentir um médico ao verificar um doente no hospital que trabalha. Serão atendidos primeiro os particulares, depois os associados aos planos de saúde e, se sobrar tempo, aqueles que vão por conta da previdência, independente da gravidade ou do risco que a doença possa significar. As coisas são assim mesmo em todas as áreas.

    Ainda bem que você tem um blog e nele consegue exercitar seu talento da forma como lhe indica seu talento, ética e técnica assimilada sem preocupação com a "pauta". É como o médico que doa parte de seu tempo a atender aqueles que mais necessitam.

    Aguardo tua publicação.

    Abraços.

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  4. é isso aí , o que tem relevancia para ser uma boa historia ne?
    historias todos temos , mas o que vai ser interessante dentro de um olhar coletivo...? ta faltando isso a muito jornalista e a quem le tambem .. parabens pelo post!!

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  5. Apesar de ser um texto enorme, ficou bacana.
    Eu vejo assim, muitas coisas não interessantes, viram notícias por causa da mídia, pela falta de notícia boa, eles pegam qualquer coisa e poem no ar para ver se dá audiência.
    E como o povo brasileiro é sem cultura, acaba assistindo e comentando.

    Abraços.

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  6. Oi Wander! nossa! bela postagem, vou gostar de ler sobre a moça em busca de seus pais biológicos num novo layout de seu blog....

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  7. Te parabenizo pelo blog, pelo conteúdo, desejando mais do que sucesso! Abração

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  8. Querido amigo avassalador...Wander.
    Se não fosse psicologa seria jornalista. Sem duvida alguma!

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  9. Que legal, também amo animais.
    Dois anos é um bom tempo, parabéns e vida longa ao blog.

    Quando uma história é bem contada, vale a pena ouvi-la até o fim. Também gosto de ler, crescemos à cada leitura :D

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  10. Acredito que jornalismo seja uma arte, e espero poder fazer parte dessa arte em breve.

    www.teoria-do-playmobil.blogspot.com

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  11. Tudo pode ser notícia, mas leva-se em conta as "oficiais". Sou a favor (em mais uma de minhas utopias) de um dia fundar um jornal com notícias cotidianas, nem por isso menos importante. Com entrevistas de pessoas comuns, e manchetes como "Seu Pereira quebra o braço ao cair da escasa"

    abç
    Pobre Esponja

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  12. Está aí uma coisa que vai muito além da intuição: realmente, um assunto que nos parece um furo, passa desinteressante pelo leitor, pelo telespectador.
    Mas o jornalista é antes de tudo um forte. E ele sabe como chegar ao seu público.

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  13. Este cara é muito bom. Excelente, óbvio. Vi uma conversa no Roda Viva da TV Cultura (acessem o site, lá encontrarão o programa completo) em que Gay Talese falava justamente sobre as reportagens com estilo literário. As notícias não podem ser tratadas apenas como meros dados jogados no papel. Devem ser, sim, aprofundados, pesquisados; como tu propõe. A desvantagem dos jornais online é esta: as notícias veem incompletas, sem fundamentação científica e o leitor fica com a mesma informação que tinha antes de ler o texto (se é que pode-se chamar algo assim de texto).

    Também tenho formação em Comunicação e fiquei super feliz ao ler que ainda há gente que não se satisfaz com as 'notícias ônibus'.

    Abraços!

    www.cobertodefarrapo.blogspot.com

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  14. Nossa, seu post de hoje foi pra mim uma viagem ao tempo, ehhe. Pude lembrar das saudosas aulas de faculdade quando aprendi sobre jornalismo literário e o novo jornalismo que certamente eram formas do jornalista ir além da informação simples e objetiva mostrando também que não é um meio superficial de comunicação como muitos teóricos adoram dizer.
    Você escreve muito bem, caro jornalista, meus parabéns.

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  15. Seu blog ótimo e esclarecedor, fazendo um grande jornalismo como sempre!

    www.nerd-na-moda.blogspot.com

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  16. Wander que fantástico! Irei acompanhar o andamento da revista por aqui. Abração!

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  17. Este realmente é o sonho de muitos jornalistas! Poder escrever livremente sem o medo da lâmina cortante dos editores, do mercado, da concorrência, da empresa, etc.

    Este mundo da blogosfera tudo é possível!

    Este é o meu começo neste mundo infinito de possibilidades!

    Parabens o blog está de parabens!

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  18. O novo jornalismo pede agilidade com cautela na busca da informação. conflitante? nem tanto, mas as novas tecnologias nos impõe, enmquanto jornalistas um que de maior arguição e de"algo a mais". um tom mais personalista nas matérias urge então e faz com que o repórter imprima o seu tom. o lead serve apenas como base de parâmetro para os fatos constítuidos. E como voc~e disse, tudo absolutamente tudo pode virara pauta, dado que tornar essa pauta interessante, hoje em dia, ficoui muito mais fácil. o difícil é distinguir o que ficará banal e será mais do mesmo do que será interessante! E para isso, o público alvo da publicação é fundamental, pois com base nele o repórter sentencia a sua escrita e profere a sua matéria. belo blog, me remeteu a fase de faculdade e a pós em docência! abraços, apareça lá pelo MFC! Prof. Leandro

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  19. Olá, tudo bem? Agradeço os comentários na coluna sobre TV no Portal Imprensa. Abraços, Fabio www.fabiotv.zip.net

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  20. Jornalismo é apenas uma em variás outras profissões em que o nivel está abaixo em muito o que ja´foi.O imediatismo a vontade de ser estrela virar celebridade, expõe as pessoas ao ridiculo; a idéia que estou numa disputa e por isso vale tudo é equivocada e por istó está tudo do jeito que estar, aos jornalistas como nosso amigo e criador deste blog, cabe a missão de informar o povo a verdade.

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  21. Essa frase que citou de Gay Talese é sensacional.
    Exatamente isso que as pessoas querem ler. Parabens mais uma vez pelo seu trabalho. O daqui eu já conheço, o da revista quero conhecer em breve. E espero um dia poder ser 'publicada'. (me lembrei de você me pedir autorização para o texto Pós Moderna? Tô Fora! - que está me dando um trabalhão diante do movimento feminista... rs)
    Aguardo mês de aniversário. Estou vendo que terão coisas ótimas para deliciar seus leitores.
    Bjs

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  22. Teu blog devia ter mais atenção dos jornalistas brother

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  23. Fiquei emocionada ao ver a imagem do bloquinho de anotações que você utilizou para ilustrar parte do post. O bloquinho é muito expressivo e me fez lembrar totalmente daquele dia em que nos encontramos para fazer a matéria da GRM. Você e o seu bloquinho, inseparáveis...

    É isso aí, Wander. O jornalismo é mesmo uma arte. Ser um bom jornalista não é para qualquer um...

    Bjos! Saudades!

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  24. ótimo post...excelente blog...passei a segui-lo...parabéns pelo trabalho...abraço!

    http://augustocanto.blogspot.com/

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