#CaféEntrevista: Rodrigo Caetano Arantes alerta sobre a importância da sociedade se preparar para a velhice

julho 05, 2019

Crédito: Arquivo Pessoal / Reprodução. 


Por Sílvia Amâncio e Wander Veroni 


Não tem volta! A população brasileira está caminhando para o envelhecimento. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase 14% da população brasileira é de idosos. Em dez anos, chegará a 38,5 milhões (17,4% do total de habitantes). Em 2042, serão 57 milhões de idosos (24,5%).

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Reportagem especial sobre a presença de idosos no Ensino Superior 

Os impactos dessa transição demográfica serão sentidos em toda a sociedade, por isso a importância de ser pensar políticas públicas para essa importante parcela da população. Para falar sobre este assunto, o blog @cafecnoticias entrevistou o doutor em Demografia e especialista em Gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), Rodrigo Caetano Arantes. Acompanhe:

1) Na sua avaliação, de que forma que o crescimento da população idosa irá impactar a nossa sociedade que, infelizmente, é tão focada em jovens e adultos? 

O envelhecimento populacional e maior número de idosos no Brasil impactará na maior necessidade de políticas públicas específicas para esse grupo etário. A saber: cidades amigáveis aos idosos com todo aparato específico como acessibilidade, acesso à saúde, cultura, esporte, lazer, previdência social digna, educação, dentre outras necessidades. 

Enquanto países mais desenvolvidos, socioeconomicamente falando (França, Suécia, dentre outros), levaram 100 anos para que suas populações atingissem um quantitativo de 7 a 14% de idosos, no Brasil esse processo ocorreu em apenas 30 anos, segundo informações das ONU e não houve tempo o suficiente para o país se preparar nas políticas públicas para uma população mais envelhecida. Ou seja, estamos envelhecendo em contextos de pobreza! 

Assim, urge que os legisladores de políticas públicas tenham um olhar para essa questão demográfica, do maior número de idosos na população. Como você pontuou, infelizmente, existe um paradigma denominado "idadismo" na sociedade, que valoriza somente a jovialidade, deixando quem envelhece e os idosos marginalizados, inferiorizando as potencialidades do grupo de 60 anos e mais (que são as pessoas consideradas idosas segundo o Estatuto do Idoso). 

É necessário desvencilhar esses estigmas relacionados aos idosos arraigados na sociedade e mostrar a potencialidade e a força desse grupo etário. A sociedade capitalista, infelizmente, vê nos idosos pessoas improdutivas, que não tem mais o que contribuir.

2) E esse crescimento da população idosa também irá impactar o mercado de trabalho? A nossa sociedade está preparada para essa mudança de perfil profissional?

Claro que impactará no mercado de trabalho. Hoje em dia, nós profissionais da Gerontologia, já identificamos a procura de uma segunda profissão após a aposentadoria por muitos idosos, por necessidade financeira e, também, em alguns casos, como motivo de manter a mente ocupada e ativa. 

As pesquisas têm mostrado que grande parte dos idosos brasileiros ganham entre 1 a 2 salários mínimos, o que nesse período de vida é muito pouco, pois tem-se um aumento das despesas com saúde e medicamentos pelo aumento da probabilidade de se ter algum tipo de doença crônica que vem com o envelhecimento. 

Além dos mais, muitos idosos são arrimos financeiros dos domicílios brasileiros, levando em consideração o alto percentual de desemprego entre os mais jovens no país atualmente. 

Em muitos semáforos das grande cidades do Brasil já são notados os "idosos de rua", mesmo com algum tipo de limitação física, vendendo balas, chicletes etc no intuito de complementarem a renda da aposentadoria.

A nossa sociedade não está preparada esse perfil de maior número de profissionais idosos. A partir da meia idade, mais ou menos uns 40 anos, o mercado de trabalho já é bem cruel, imagina com os idosos! 

Para as empresas que contratam idosos tem-se o benefício da experiência profissional e de vida desses e toda a maturidade que o envelhecimento traz. Por outro lado, alguns estudiosos apontam que manter idosos por muito tempo no mercado de trabalho pode gerar mais dificuldade e desemprego para os jovens que estão entrando no mercado de trabalho. 

Particularmente, eu vejo que manter-se no mercado de trabalho, por opção, frisa-se, pode ser benéfico no sentido de manter a mente ativa, buscando-se sempre um envelhecimento saudável e com qualidade de vida. 
Crédito: Arquivo Pessoal / Reprodução. 
É claro que deve-se sempre respeitar a vontade do idoso e ponderar a realização de trabalhos que deem prazer. E não somente trabalhar por complementar a aposentadoria, o que, infelizmente, é a realidade da grande maioria dos idosos! 

A sociedade deve se desvencilhar de todos os estigmas relacionados à velhice e cabe a nós, defensores e militantes da área do envelhecimento, mostrar todas as potencialidades que podem advir nessa fase da vida.

3) Esse crescente número de idosos também acaba sendo estimulado a procurar o ensino superior? Você acredita que as Universidades estão preparadas para esse novo perfil de aluno? O que precisa ser feito ou mudar?

Como estudioso da área do envelhecimento, vejo com bons olhos os idosos voltarem ao banco escolar. Infelizmente, também é realidade de muitos idosos no Brasil não ter tido acesso à educação básica e não saber nem ler e escrever. 

A falta de escolaridade entre os idosos atinge principalmente as mulheres, grande maioria quando se trata do envelhecimento, devido à feminização da velhice, isto é, o fato delas viverem, em média, 7 anos a mais que homens, segundo as pesquisas do IBGE. 

As mulheres devem lutar mesmo pelos seus direitos por sempre terem sido historicamente muito prejudicadas devido ao machismo arraigado na sociedade. Em outra perspectiva, já nota-se avanços neste sentido, pois um tempo atrás, as mulheres, hoje idosas, só podiam escolher o magistério como possibilidade de profissão.

Voltando à temática de idosos no ensino superior, vejo que ser muito benéfico para aqueles/aquelas que optam por isso, repito a importância de se manter a mente ativa e ocupada para um envelhecimento bem-sucedido e saudável. 

Creio que, a grande maioria dos idosos, que escolhe cursar o ensino superior nessa fase da vida, seja com esse objetivo. Vemos na mídia exemplos belíssimos de idosos que se formam em Direito, Medicina, dentre outros cursos, em idades já bem avançadas!

Temos também que desvencilhar o estigma que algumas pessoas podem ter de que idosos não aprendem e são incapazes. Para aqueles/aquelas idosos que não tiveram essa oportunidade durante a vida, a de cursar o ensino superior, aconselho que nunca é tarde para isso!

No entanto, é preciso pontuar que as universidades têm que estar preparadas para receber esse contingente de idosos, pois eles necessitam de pedagogias diferenciadas, devido algumas condições de saúde que podem acompanhar o processo senescente do envelhecimento, como a dificuldade visual, dificuldade auditiva, questões da acessibilidade, dentre outras. 

As universidades têm que direcionar metodologias de ensino próprias para os idosos (letras maiores em apresentações visuais em sala de aula e ter em mente que pode haver uma necessidade de se repetir mais de uma vez determinado conteúdo para a aprendizagem etc).

4) Como membro do Conselho Estadual da Pessoa Idosa, há alguma ação que incentiva o idoso a estudar, seja no ensino de Jovens e Adultos, seja no Ensino Superior? Ou ainda há algum tipo de apoio a concluir os estudos?

Sempre apoiamos que os idosos voltem aos bancos escolares, independentemente de qual nível escolar for. Costumo dizer em minhas palestras que aquele idoso que não sabe ler e escrever deve procurar o EJA (Escola de Jovens e Adultos), pois saber ler ajuda, inclusive a tomar os medicamentos da forma correta. 

O que vejo em muitos casos é idosos tomando os medicamentos de forma errada por não saberem ler, muito ruim isso! E a volta aos bancos das universidades especificamente, ajuda a manter a mente ativa, os idosos a serem produtivos.

5) Que ações afirmativas que as políticas públicas podem ser feitas para promover o acesso dos idosos ao ensino superior?

As políticas públicas voltadas à educação de idosos devem incentivar a volta aos bancos escolares, independentemente do nível, e mostrar as potencialidades que podem advir com o envelhecimento, quebrando paradigmas que a sociedade tem com relação aos idosos e à velhice em si, como fase improdutiva e que os idosos não têm mais o que contribuir na sociedade. Eles podem e devem contribuir e mostrarem a força de suas opiniões e decisões, inclusive políticas.

6) De que maneira podemos propor uma sociedade mais inclusiva sobre as questões do envelhecer, sobretudo na entrada de idosos no ensino superior?

Sendo agentes propagadores do envelhecimento ativo com bem-estar e qualidade de vida. Por mais que na velhice estejamos mais sujeitos às doenças crônicas e incapacidades funcionais devemos mostrar e vencer esse retrato que as pessoas têm do envelhecimento, como antessala de espera para a morte. 
Crédito: Arquivo Pessoal / Reprodução. 
A prática do envelhecimento ativo deve começar hoje por todos nós, independentemente da idade, com a prática de exercícios físicos, alimentação saudável e equilibrada, manutenção das redes de relações sociais e dos papeis sociais, principalmente na velhice.

O Estatuto do Idoso no artigo 22 pontua sobre a inserção no currículo mínimo da formação do ensino básico e fundamental para as crianças e jovens a necessidade de: "conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, ao respeito e à valorização do idoso, de forma a eliminar o preconceito e a produzir conhecimentos sobre a matéria". 

Vejo como sendo muito importante inserir uma disciplina na formação das crianças e jovens sobre o respeito e valorização dos idosos, isso porque, infelizmente, a cultura ocidental, diferentemente da oriental, ainda tende a desvalorizar e ter preconceitos relacionados aos idosos e quem 

E a educação formal (vinda das escolas) pode ser aliada na educação dada em casa (educação informal) no sentido de frisar o respeito aos mais velhos. Especificamente com relação ao ensino superior, sempre aconselho que sonhos não têm idade, se você idoso, que quando jovem, não teve a oportunidade de cursar o ensino superior, não imponha limites por questões etárias.

7) Tem alguma atuação do Conselho Estadual que você gostaria de destacar?

Relaciona-se mais na propagação do Artigo 22 do Estatuto do Idoso, supracitado, no intuito de desvencilhar preconceitos relacionados aos idosos e ao processo de envelhecimento. Sempre dou o exemplo em minhas palestras que, infelizmente, desde a mais tenra idade somos levados à desvalorização dos idosos. 

Você já parou para pensar que na história da Branca de Neve, por exemplo, a bruxa má e feia é uma idosa? As histórias infantis já podem nos incutir a ideia de que a velhice é algo ruim... Já parou para pensar nisso? 

Convido vocês a quebrarem todos os paradigmas relacionados à velhice e aos idosos e que possamos propagar que a velhice pode sim vir acompanhada de excelentes oportunidades de aprender algo novo, ser dono da sua própria história, tornar-se empreendedor, conviver com os netos e até bisnetos ou fazer algo que nunca se tenha feito antes. A velhice é fase da vida como qualquer outra! Vivamos intensamente!






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