19ª Mostra de Cinema de Tiradentes discute conflitos sociais contemporâneos
janeiro 31, 2016![]() |
Foto: Leo Fontes / Universo Produção. |
Nove dias de programação, 117 filmes
de 14 Estados, 57 sessões, 25 seminários, 10 oficinas, 495 convidados e 35 mil
pessoas alcançadas pela força do cinema brasileiro. Estes são números que
reafirmam a 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes
como uma das principais vitrines da produção audiovisual do País. Famosa pela
pluralidade e diversidade, a Mostra se destaca no cenário do cinema
contemporâneo e há tempos é referência para amantes e operários da sétima arte.
Seminários, debates, oficinas,
exposições, lançamentos de livros e DVDs, teatro de rua, shows e performances
audiovisuais convergiram continuamente com os objetivos principais do evento:
formação, reflexão e a difusão do cinema brasileiro. Dentre os 117 filmes em
pré-estreias nacionais e mundiais, foram apresentados 35 longas e 82
curtas-metragens em três espaços de exibição: Cine-Tenda, Cine BNDES na Praça,
e Cine-Teatro Sesi.
O impacto econômico do evento na
cidade pode ser avaliado por alguns números. De Tiradentes, São João Del Rei e
Belo Horizonte, foram contratadas 152 empresas prestadoras de serviços, gerando
muitos empregos diretos e indiretos na região. Ao todo, 163 pessoas integraram
a equipe de trabalho – entre montadores, agentes de trânsito, limpeza,
técnicos, assistentes, produção e coordenação.
A cada ano, a cidade de Tiradentes
reafirma o seu potencial para receber eventos culturais. Nesta edição, 21
pousadas e 14 restaurantes foram parceiros da Mostra na recepção dos convidados
e turistas. O evento recebeu a cobertura de 54 veículos de imprensa e 72
jornalistas. Em março deste ano, a Mostra de Tiradentes chega a São Paulo, pelo
quarto ano consecutivo, numa parceria com o Sesc São Paulo.
Debates
Relacionando a atual situação
brasileira de crise financeira e política, as possibilidades de um cinema
independente caracterizado pela inventividade de novas formas e a pluralidade
de linguagens e geografias percebidos na tela, a Mostra ofereceu um amplo
panorama.
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Foto: Jackson Romanelli / Universo Produção. |
Destacaram-se diálogos firmes e
contundentes que posicionaram as questões em sentidos urgentes, fazendo jus à
proposição de que “é preciso haver forças em oposição, contrastantes e até não
conciliáveis para, em uma narrativa, os personagens se moverem”, segundo
palavras do curador, Cléber Eduardo.
O tema da Mostra Tiradentes
deste ano foi o dos “Espaços em Conflito no Cinema Brasileiro Contemporâneo”,
refletido nos seminários e em boa parte das produções audiovisuais exibidas na
programação. “Não podemos ignorar que as formas de representação dos espaços,
em quaisquer épocas, não são operações apenas narrativas, mas também e
especialmente políticas”, destacou Cléber.
Para o pesquisdor Hernani Heffner, a
efervescência atual das questões mais presentes na pauta midiática trouxe
complicações a quem se aventura a fazer um filme: “O diretor muitas vezes se
torna um cronista do problema, muito mais do que alguém que achará a solução. A
posição do realizador é complicada, porque ele precisa ir atrás de qual
conflito filmar e como fará isso, e nem sempre está tudo muito claro”.
Durante um debate, Ismail Xavier,
professor e crítico, afirmou que a pauta do mundo, hoje, é marcada pela não
concretização dos ideais da Revolução Francesa de igualdade, liberdade e
fraternidade. “Os filmes que lidam com espaços urbanos e de maior notoriedade
estão naquele exemplo clássico da relação entre favela e asfalto, na ideia dos
bolsões, dos territórios onde a ordem de relações de poder não são aquelas de
um estado republicano”, disse Ismail. Maria Augusta Ramos, diretora de “Futuro
Junho”, destacou que todo o seu cinema é pautado pelo espaço e pelas relações
das pessoas nesses espaços: “Sem eles, a relação que ela estabelece com aquilo que
quero filmar nem sequer existiria”.
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Foto: Leo Lara / Universo Produçao. |
Para João Luiz Vieira, professor na
UFF (Niterói – RJ), um filme como “Banco Imobiliário”, exibido na Mostra Aurora
deste ano, propõe outro tipo de combate e de abordagem, ao se aproximar
amigavelmente das figuras que pretende documentar sem deixar de reconhecer seus
papéis de opressão e poderio dentro da sociedade. O diretor do longa, Miguel
Antunes Ramos, identifica, de fato, a intenção de olhar o processo sem
estigmatizá-lo: “O filme surgiu na ideia de se materializar o que seria a
construção imobiliária através da linguagem”.
Reflexões
A Mostra ainda teve espaço para
reflexões aprofundadas dos limites da criação, em filmes que transitaram por
searas indefinidas e enigmáticas, como “Garoto”, de Julio Bressane, “O Espelho”,
de Rodrigo Lima, e “Ralé”, de Helena Ignez, enquanto outros mergulharam nas
contradições humanas e na violência das grandes cidades, em situações de tensão
e medo como vistas em “Jonas”, de Lô Politi, e “Urutau”, de Bernardo Cancella
Nabuco. Todos, em suas medidas, ofereceram formas distintas de retratarem os
espaços em conflito.
Tais espaços ainda se fizeram
representados no Cine-Teatro Sesi, numa série de Encontros com a Crítica, o
Diretor e o Público permeados por intervenções relativas a representações de
gênero, raça e classe social, mostrando que o espectador está atento ao que vem
sendo discutido em instâncias para além da arte.
Alguns debates chegaram a momentos de
tensão entre os participantes, como o papo sobre “Jonas”, no qual a diretora, Lô
Politi, foi interpelada pela maneira como filmou a protagonista sequestrado
pelo personagem de Jesuíta Barbosa; ou nas mesas de “Banco Imobiliário” e
“Filme de Aborto”, em que ideias sobre diferenças entre classes afloraram a
partir das proposições de cada trabalho.
Num contexto como este, a importância
do reconhecimento a Andrea Tonacci veio em momento perfeito, por se tratar de
um artista referencial a toda esta geração e que já toca em vários destes temas
há anos, em filmes imprescindíveis como “Bang Bang” (1970) e “Serras da
Desordem” (2006). Este último, aliás, abriu a programação, ao completar dez
anos desde sua pré-estreia no mesmo Cine-Tenda. “Um tributo como esse faz a
gente pensar na responsabilidade do que faz, em como o trabalho da gente chega
até onde nem esperávamos”, disse Tonacci.
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Foto: Leo Fontes / Universo Produção. |
Numa mesa de debate sobre sua obra,
Tonacci contou de seu processo criativo, afirmando que está sempre em busca da
imagem que lhe seja inédita. “Se eu penso numa imagem e identifico que ela já
existe, então eu falhei e preciso recomeçar”, disse.
“Viver um filme é viver uma
experiência que é da tua condição humana, da sua vida, ela só faz sentido se
você conhece esse sentimento”. Ao seu lado, a montadora e parceira, Cristina
Amaral, completou: “Estar com ele é encontrar esses momentos de revelação, de
quando o filme acontece”.
Prêmios
Na noite de sábado, dia 30 de
janeiro, o filme “Jovens Infelizes ou um Homem que Grita não é um Urso que
Dança”, produção paulista de Thiago B. Mendonça, foi o grande vencedor do
Troféu Barroco de melhor longa-metragem da Mostra Aurora, na escolha do Júri da
Crítica da 19ª Mostra de Cinema de Tiradentes. Exibido na sexta-feira, dia 29,
a produção acompanha um grupo de jovens numa São Paulo cheia de conflitos
sociais e urbanos.
“Ver esse trabalho sendo recebido da
maneira como foi aqui, demonstra que a gente pode utilizar o cinema para as
nossas lutas”, disse Thiago, no palco do Cine-Tenda. “Dedico este troféu ao
Movimento Mães de Maio, que continuam na batalha diária lá em São Paulo”.
O Júri da Crítica também premiou um
curta-metragem da Mostra Foco. O escolhido foi “Noite Escura de São Nunca”
(RJ), de Samuel Lobo. “Acredito num cinema de invenção e de criação. Foi um
privilégio exibir o filme aqui em Tiradentes, ainda mais tendo ganhado esse
prêmio”, celebrou o cineasta, no agradecimento.
Por sua vez, o Júri Jovem – formado
por cinco estudantes universitários entre 18 e 25 anos – avaliou os longas da
Mostra Transições. O escolhido foi “Tropykaos” (BA), deDaniel Lisboa. “Eu não
esperava ganhar, então não preparei nada para falar”, brincou o realizador,
agradecendo parte da equipe de seu filme, que estava presente no Cine-Tenda.
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Foto: Leo Lara / Universo Produção. |
Pelo Júri Popular, os vencedores
foram o longa “Geraldinos” (RJ), de Pedro Asbeg e Renato Martins; e o curta
“Madrepérola” (RS), de Deise Hauenstein. O Prêmio Aquisição Canal Brasil foi
para o curta-metragem “Eclipse Solar” (ES), de Rodrigo de Oliveira. Abaixo,
confira a lista de vencedores:
Melhor curta pelo Júri Popular:
“Madrepérola” (RS), de Deise Hauenstein
- Troféu Barroco
- R$ 5 mil em serviços de iluminação da Ciario
- 20 horas de mixagem do CTAV
- R$ 8 mil em serviços de finalização da Mistika
Melhor curta da Mostra Foco pelo Júri
da Crítica: “Noite Escura de São Nunca” (RJ), de Samuel Lobo
- Troféu Barroco
- R$ 5 mil em serviços de iluminação da Ciario, acessórios e
maquinários
- Empréstimo de câmeras do CTAV
- Duas diárias de correção de cor e master DCP para até 20 minutos
da Dot Cine.
Melhor curta pelo Canal Brasil:
“Eclipse Solar” (ES), de Rodrigo de Oliveira
- R$ 15 mil do Canal Brasil
Melhor longa da Mostra Transições
pelo Júri Jovem: “Tropykaos” (BA), de Daniel Lisboa
- Troféu Barroco
- R$ 8 mil em iluminação, acessórios e maquinário da Ciario
- R$ 10 mil em pós-produção da Cinecolor
- R$ 15 mil em pós-produção da 02 Pós
Melhor longa da Mostra Aurora pelo
Júri da Crítica: “Jovens Infelizes ou um Homem que Grita não é um Urso que
Dança” (SP), de Thiago B. Mendonça
- Troféu Barroco
- R$ 8 mil em iluminação, acessórios e maquinário da Ciario
- R$ 10 mil em pós-produção da Cinecolor
- R$ 15 mil em pós-produção da 02 Pós
- Master DCP para longa até 120 minutos da Dotcine
Melhor longa pelo Júri Popular:
“Geraldinos” (RJ), de Pedro Asbeg e Renato Martins
- Troféu Barroco
- R$ 30 mil em finalização da Mistika
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