Cine Café – Filme Repórteres de Guerra e os desafios do fotojornalismo
maio 02, 2012
Vale
tudo por uma boa foto? Até que ponto o fotógrafo não deve interferir na
notícia? A segurança do fotógrafo deve estar acima de uma boa foto? Os veículos
jornalísticos devem oferecer suporte psicológico aos profissionais que cobrem
tragédia diariamente? Esses são alguns debates que permeiam o filme Repórteres de Guerra (The Bang Bang Club), lançado em setembro de 2011 no Brasil,
diretamente em DVD.
Baseado
no livro The Bang Bang Club: Snapshots
from a Hidden War, publicado em 2001, o filme conta a história dos fotógrafos
e amigos inseparáveis Ken Oosterbroek, Kevin Carter, João Silva e Greg
Marinovich, que durante anos se dedicaram a cobertura de conflitos sangrentos e
guerras civis no continente africano. O livro foi escrito pelo português radicado em Moçambique João
Silva e pelo sul-africano Greg Marinovich, os dois únicos sobreviventes do
clube, sendo Marinovich e Carter os únicos a ganharem o Prêmio Pulitzer de Jornalismo.
Com um
orçamento de US$ 4 milhões e distribuído pela Paris Films, Repórteres de Guerra (The Bang Bang Club) tem a direção de Steven Silver, sul-africano
radicado no Canadá. No elenco, nomes como o do americano Ryan Phillippe, que vive
Greg Marinovich; o canadense Taylor Kitsch, que faz Kevin Carter e os
sul-africanos Frank Rautenbach e Neels van Jaarsveld, que interpretam,
respetivamente, Ken Oosterbroek e João Silva.
O fotógrafo Greg Marinovich e o ator Ryan Phillippe durante o lançamento do filme no Festival Tribeca Film. Foto: Divulgação. |
Tanto o
livro, quanto o filme, narram os linchamentos e torturas brutais travadas entre
os zulus do partido Inkatha – aliados estratégicos do governo de etnia branca, e os
militantes do Congresso Nacional Africano de Nelson Mandela, no período entre a
libertação de Mandela, em 1990, e as primeiras eleições livres da África do
Sul, em 1994. Pelo relato das obras, fica evidente que violência era plantada
pelo próprio governo de etnia branca, numa tentativa desesperada e cruel de boicotar a
transição para a democracia plurirracial.
Crítica
Apesar
de ser um filme que explora com detalhes a história da África do Sul e dos debates éticos em torno do fotojornalismo de
cobertura de violência extrema, Repórteres
de Guerra (The Bang Bang Club) tem um roteiro fraco com alguns problemas pontuais de construção da
história, além de falhas na edição final. Isso é possível perceber porque, em
muitos momentos, a trama parece confusa e não foca, necessariamente, no
grupo dos quatro fotógrafos – deixando apenas Greg Marinovich e Kevin Carter como
protagonistas, e dando ênfase a história da África do Sul, ao invés de deixa-la como pano de fundo. João Silva, um dos autores do livro, tem pouquíssimas falas no
filme, e a sua história é tratada de forma mínima, sendo quase um figurante de luxo.
Montagem com as fotos originais e no filme que renderam o Prêmio Pulitzer de Jornalismo aos fotógrafos Greg Marinovich e Kevin Carter. |
Outro
ponto falho do filme e que não fica muito bem explicado para o público é se os quatro fotógrafos também escrevem matérias ou saem às ruas caçando registros
sob encomenda do editor. Isso é estranho, principalmente, porque de nada
adiantaria se eles chegassem com uma excelente foto da Guerra Civil, mas sem
uma boa história dessa foto, um relato jornalístico que valeria uma capa. Havia um repórter que os acompanhava ou eles
passavam o relato das ruas ao um redator de plantão no jornal?
Se eles
chegarem na redação com uma super foto sem história desta notícia, como ela vai
para na capa do Jornal? O texto não brota sozinho, ainda mais em jornal
impresso e agência de notícias que são o foco do filme. Isso é um detalhe que deveria
ter sido explorado no roteiro do filme. E, para finalizar, outra coisa que
achei estranho: é um filme biográfico sobre quatro fotógrafos que não trabalha detalhes estéticos de fotografia e luz, focando mais na crueldade da guerra civil sul-africana.
Cena do filme Repórteres de Guerra (The Bang Bang Club). Foto: Divulgação. |
Para não ser injusto, há algumas cenas (fotográficas) muito bem construídas a partir do cenário já proposto das fotos premiadas de Greg
Marinovich e Kevin Carter, mas o filme se limitou a isso. Não houve um passo
além, de se pensar a fotografia como protagonista do filme ou como elemento chave. Destaque para o
ator Taylor Kitsch, que faz Kevin Carter, que conseguiu construir de forma
segura o personagem que, em muitos momentos, lembra Johnny Depp, principalmente
pelo gestual e físico.
Repórteres de Guerra (The Bang Bang Club) é o
tipo de filme que tinha tudo para ter concorrido a vários prêmios internacionais
de cinema – principalmente ao Oscar, se tivesse ousado mais no roteiro, na direção de fotografia e na
edição final. Os atores são bons em cena, mas não conseguem fazer milagre com o roteiro limitado e confuso. A impressão que dá é que houve perda de foco na história, onde o
diretor em um determinado momento do filme ficou sem saber se contava a
biografia dos repórteres fotográficos ou se denunciava por meio das cenas de
violência o terror da Guerra Civil sul-africana, o que é uma pena porque a
história é sensacional, principalmente pelo companheirismo e amizade desses
quatro fotógrafos.
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Jornalista
6 comentários
Boa resenha, Wander. O interessante que mesmo sendo uma resenha detonando o filme, vc a fez de uma forma tão envolvente que me deu vontade de assistir o filme...hehehe. Gosto muito de filme de guerra. Abraços
ResponderExcluirAssisti esse filme na faculdade, quando o professor passou. Também achei o roteiro confuso, mas vale a pena pela história de pano de fundo e por mostrar um pouco da rotina dos repórteres fotográficos.
ResponderExcluirComo amante da fotografia que sou, me interessei pelo filme, mesmo com a critica negativa que fizeste. Aliás, crítica muito bem escrita por sinal. Parabéns pelo blog. Abraços
ResponderExcluirEi querido. Mesmo que o filme tenha esses probleminhas na história como você bem pontuou, acho super válida a dica. Deve ser brabo ter que cobrir tragédia todos os dias. Tem que estômago de aço. Parabéns pela resenha. Beijos
ResponderExcluirMesmo com a crítica não muito favorável, já separei esse filme para ver no final de semana. É sempre muito bom revisitar filmes que tem conteúdo, que abordam a história e ainda mostra um relato profissional. Vou assistir e depois comento o que achei.
ResponderExcluirEu achei que a crítica não é muito justa.
ResponderExcluirE, quero deixar claro que é apenas minha opinião, um ponto de vista diferente... nada mais.
Porém, como o Steven Silver é sul-africano, ele quis mostrar a realidade de seu país e mostrar COMO e principalmente ONDE surgiu o 'Bang Bang Club', então se analizar deste ponto de vista o filme é bastante convincente, mesmo com um roteiro não tão 'experiente' (se for comparado às super produções Hollywoodianas e filmes deste orçamento)
Mas, ainda assim é válido considerar uma ótima obra, pois expõe como um fotógrafo jornalístico trabalha, os problemas que ele enfrenta e principalmente a crítica de quem não estava lá no momento da foto mas adora perguntar porque isso ou por que não aquilo...