#Crônica: Todo mundo tem direito de errar, mas permanecer no erro...

novembro 23, 2014

Foto: Site Estrela da Manhã / Reprodução.


Acordei no meio da noite, de madrugada. Fiquei pensando em algo que aconteceu no dia anterior, no supermercado. Encontrei com a mãe de um ex-aluno. Nestas perguntas corriqueiras que a educação nos exige, ela confidenciou que o filho dela tinha sido preso. Pegou 12 anos. O motivo: matou um homem.

Fiquei perplexo. Principalmente, porque esse meu ex-aluno é um menino super inteligente. Tem uma facilidade enorme com contas, números e cálculos. Com 12 para 13 anos, desenhava projetos de carros com nível de verdadeiros engenheiros. Aprendeu a fazer isso sozinho, via internet e tutoriais.

Por uma questão de privacidade, tomo a liberdade de dar um nome fictício a este meu ex-aluno. Neste texto, ele será João. A mãe de João, na verdade, procurou a minha mãe para ter aulas particulares para uma prova que João teria que fazer nestas escolas técnicas em que se faz o ensino médio junto com um curso profissionalizante.

Na época, minha mãe teve que parar de dar aulas particulares porque havia passado em um concurso público. Então, ela me indicou para dar aulas para o João. Como fazia faculdade à noite e, na época, estava sem fazer estágio, aceitei. A mãe do João também concordou.

O impressionante é que João só queria ter aulas de Português, Geografia, Ciências e História para fazer a prova. Não queria Matemática, porque ele já sabia. Insisti com ele para fazermos os exercícios como treino. No início, João não gostou, mas cedeu. Acabou que quem me deu aula no “mundo dos números” foi João. Passei a admirar mais a Matemática por causa dele.

As aulas duraram cerca de três meses. Quando veio a prova, João passou em um dos primeiros lugares. Completou o curso de Automação com louvor e chegou a trabalhar como mecânico em uma retífica. De vez em quando, via não só João, como o irmão dele e a mãe, pelo bairro. Dizia ao João que um dia ainda iria ver os carros que ele projetou na rua. Ele sorria.

Talvez, isso tenha me marcado tanto. João foi um dos meus primeiros alunos. Ao descobrir que ele estava preso, gelei. Como pode um menino tão bom assim cair no mundo do crime? De acordo com a mãe dele, as companhias erradas foram o divisor de águas. João começou a andar com o “movimento” (grupo envolvido com marginalidade, na gíria popular).
Foto: Site Acorda Bonita / Reprodução.

No supermercado, a mãe disse que João não matou ninguém, mas como andava com o grupo, se tornou cúmplice. O advogado da família conseguiu provar isso, mas o Juiz determinou 12 anos de prisão. Quando ele completar quatro anos e continuar com um bom comportamento, poderá ter liberdade condicional, voltar para casa e trabalhar.

A mãe contou ainda que o dono da retífica disse que quando ele sair da prisão pode procura-lo que o emprego de João está garantido. Atualmente, ele faz trabalhos artesanais na prisão para aliviar a pena e passar o tempo. A história não saiu da minha cabeça.

À noite, no pouco que consegui cochilar, sonhei que tinha ido visitar João na cadeia. Ao encontra-lo, nos emocionamos. Ele chorou de vergonha por ver a mãe e as pessoas que gostam dele passar por isso, de ir numa penitenciária. E eu chorei por vê-lo preso. Pensava, onde foi que eu errei? Será que faltou diálogo?

Quando acordei hoje de manhã, me dei conta de que não tenho culpa. Aliás, ninguém tem culpa pelas escolhas das outras pessoas. Infelizmente, na periferia, andar com o “movimento” é muito sedutor: status, poder, dinheiro, entre outras coisas. Tenho amigos já da minha idade que estão presos ou morreram por conta deste tipo de escolha.

Viver é uma escolha. Por mais que o mundo esteja de cabeça para baixo, que os valores estejam trocados, eu ainda prefiro acreditar na honestidade, na lealdade, no trabalho e na Justiça. É muito mais fácil aceitarmos a corrupção nas suas mais diversas formas...o difícil mesmo é ser honesto. E isto é para os fortes! Não sei como João está, mas quero ajuda-lo se ele quiser ajuda. Afinal, todo mundo tem direito de errar, mas permanecer no erro....








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Jornalista


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