Jornal Nacional transforma a rotina da seleção brasileira em reality show
julho 02, 2014Foto: TV Globo / Reprodução. |
Não importa o horário ou clima. Faça
frio ou faça sol, Patrícia Poeta e Galvão Bueno aparecem no Jornal Nacional (JN) para falar do
dia-dia da seleção brasileira diretamente da Granja Comari ou de algum ponto das cidades-sede da Copa do Mundo no Brasil.
Até aí, tudo bem. Mas, o
telespectador mais atento, já se deu conta que nem tudo são flores. Será mesmo
que existe a necessidade de transformar em pauta tudo que acontece na
concentração? O fato é que dupla inusitada de apresentadores do JN sobre a Copa do Mundo, aparentemente, funcionou no vídeo – apesar de
Patrícia ter se entregado bem menos à reportagem e ficar apenas na função de
apresentadora. E logo vêm comparações.
Fátima Bernardes, hoje à frente do Encontro nas manhãs da Globo, na época
do JN, não se contentava apenas em
apresentar. Ela ia para o campo fazer matérias com jogadores e com todos os
personagens possíveis de uma Copa do
Mundo. E, por conta desta dedicação, ganhou naquela época o título de “Musa
da Copa”.
Já Patrícia se limita à dobradinha da
Copa na hora do telejornal. Nos bastidores, há quem duvidasse que a parceria
com Galvão Bueno poderia não
funcionar por conta do humor dos dois. E, graças a Deus, funcionou no vídeo.
Dividindo opiniões como sempre, nas
redes sociais alguns internautas consideram a hipótese de que a versão mais
light e menos egocêntrica de Galvão, contribuiu para diminuir a taxa de
rejeição do público não só aos dois na TV, mas sobretudo da pauta Copa no
Brasil.
Por conta das manifestações de junho
de 2013, a imprensa estava receosa de como seria a cobertura dos jogos da Copa do Mundo. Houve toda uma
avaliação de como seria a abordagem utilizada e de que maneira uma pauta não
abafaria a outra. E como as manifestações não decolaram por conta da saturação
de alguns grupos quererem associar manifestação com vandalismo, os noticiários
investiram na emoção verde-amarela.
E com o Jornal Nacional não foi diferente. Patrícia e Galvão se tornaram os
âncoras principais do reality que se transformou a Granja Comari, em Petrópolis, no Rio de Janeiro. Quem não consegue
acompanhar a Copa durante o dia ou quer saber de qualquer coisa sobre a seleção,
basta conferir o telejornal.
Mas daí um adendo sobre esse “tudo da
seleção”. Como detentora dos direitos, é natural que a Rede Globo dedique mais tempo do que o habitual para falar de Copa do Mundo no seu principal
noticiário. Mas, na maior parte das vezes, a Globo peca pelo exagero. Já bastam
as redes sociais que são um verdadeiro “diário de bordo” dos jogadores.
Foto: TV Globo / Reprodução. |
Da comida que é servida na
concentração ao exercício que Hulck, David Luiz ou Neymar Jr. deixaram de fazer –
ou passaram a fazer. Tudo, mas tudo mesmo pode virar pauta não só para o Jornal Nacional ou para os mais
diversos telejornais ou boletins espelhados pela programação da emissora
carioca que cobrem a Copa. Será que nos damos conta desta overdose informativa?
Outro dia, pelo Twitter, Bonner fez
piada com o fato de ter aparecido só 57 segundos no próprio telejornal do qual
é editor-chefe. Mais do que dar um espaço considerável para as notícias
relacionadas à Copa, o JN peca em
dar um tom frenético para o dia-dia dos jogadores.
E acredito que aí reside uma linha tênue
entre cobertura jornalística e espetáculo – por isso a provocação de ser uma
cobertura em formato de reality show. A Granja
Comari se tornou a “casa mais vigiada” do país em um mês. Só faltou o Bial
para o circo eletrônico ficar completo. Brincadeira.
Só para você ter uma ideia, um
exemplo recente do quanto a seleção brasileira reprime outros assuntos tão ou
mais relevantes: o Plano Real fez 20
anos esta semana e não ganhou destaque no Jornal
Nacional. Nem uma nota. Mas em compensação o Brasil inteiro sabe que o
Neymar tem uma chuteira dourada e que o Felipão vai propor mudanças na seleção
para o jogo contra a Colômbia, na próxima sexta-feira (02/07).
Como telespectador, às vezes me
incomoda o fato dos jornalistas terem que falar de qualquer coisa que envolve a
seleção brasileira o tempo todo. Menos é mais. Fico pensando o quanto deve ser inconveniente
ter a vida, o treino e as emoções devastadas pela imprensa diariamente.
Comentaristas avaliando qualquer atitude ou até mesmo colocando “lenha na
fogueira”, já é demais. Do jeito que vamos, a Granja Comari vai virar o Big
Soccer Brasil. Falta pouco. Ou melhor, falta nada.
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Jornalista
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