Brasil comemora 10 anos da Lei de Reforma Psiquiátrica

maio 18, 2011


Promover a inclusão social, a solidariedade e a dignidade de milhares de pessoas que sofrem de doenças mentais pelo país. Esses foram alguns dos pilares que ajudaram a criar um longo debate, que começou no final da década de 1960, a respeito da luta antimanicomial que culminou, no dia 06 de abril de 2001, na sansão da Lei 10.216, conhecida como a Lei da Reforma Psiquiátrica, que completou dez anos este ano.

Apesar da primeira década da lei em vigor no país, da extinção dos sanatórios para a criação de residências terapêuticas e Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) - que trouxeram um modelo de atendimento mais humanizado, ainda há muito que ser feito e debatido. No início de maio, o Ministério da Saúde habilitou 26 Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) que reforçarão a rede de atendimento em saúde mental no Sistema Único de Saúde (SUS).

Agora, são 1.650 em funcionamento em todo o país, contemplando 12 estados: Piauí, Pará, Rondônia, Sergipe, Bahia, Goiás, Rio de Janeiro, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco e Paraná. Os CAPS estão estruturados para o atendimento de pacientes (adultos, adolescentes e crianças) com transtornos mentais, usuários de drogas, como crack, e álcool. Ao todo, serão investidos R$ 7,7 milhões, por ano, para a manutenção e funcionamento dos serviços.

Pioneira nos trabalhos de reforma psiquiátrica, Minas Gerais possui hoje 162 Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), credenciados pelo Ministério da Saúde. Também existem 77 serviços de Residência Terapêutica e 23 Centros de Convivência de Saúde Mental. Além dos CAPS, existem cerca de 300 equipes de saúde mental na Atenção Primária da Saúde, 159 equipes de Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), com 129 profissionais de saúde mental, 20 Associações de Usuários e familiares de serviço de Saúde Mental e, aproximadamente, 3700 equipes de Saúde da Família. Ao todo, Minas possui 18 hospitais psiquiátricos, sendo quatro da Rede Fhemig e 14 privados conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS) com, aproximadamente, 2300 leitos - sendo cerca 930 leitos crônicos (pacientes asilares) e uma média de 1370 pacientes agudos de curta permanência.

Inclusão

Outra importante data que reforça ainda mais os trabalhos de inclusão da reforma psiquiátrica, é o dia 18 de maio, onde se comemora o Dia Nacional da Luta Antimanicomial. A data tem como objetivo contribuir para o enfrentamento do preconceito que ainda persiste nas pessoas que possuem doenças mentais, reafirmando o compromisso com os direitos humanos e a qualidade de vida desses pacientes. Em Belo Horizonte, acontecerá uma manifestação para alertas as pessoas em torno da importância da luta antimanicomial.

O tema deste ano é “Histórias da Loucura: Michel também Contou”, que celebra os cinqüenta anos da publicação do livro “A História da Loucura na Idade Clássica”, de Michel Foucault. O evento que tem a realização do Fórum Mineiro de Saúde Mental e da Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais (ASUSSAM-MG), que também preparam um desfile com a escola de samba “Liberdade Ainda que Tamtam”, onde a concentração acontece na Praça 7, no centro de BH, a partir das 13h. Para saber das atividades que acontecem no interior, mais especificamente, em Manhumirim, clique aqui e acesse o blog do Fórum de Saúde Mental.

História

Oferecer aos doentes mentais um tratamento mais digno e humano. Foi assim que, em meio a ditadura militar, entre a década de 1960 e 1970, nascia entre os profissionais de saúde, pacientes, familiares e entusiastas o movimento que culminou na luta antimanicomial. Em setembro deste ano, comemoramos 32 anos da Reforma Psiquiátrica em Minas Gerais e dez anos da Lei 10.216, conhecida como a Lei da Reforma Psiquiátrica, sancionada em 06 de abril de 2011.

“Mas a lei mesmo demorou quase 12 anos para ser aprovada. Foram muitos anos de luta contra os interesses contrários que se alimentavam, e ainda se alimentam, da doença mental, o que denominamos de indústria da loucura. O processo de reforma psiquiátrica no Brasil é bem anterior: começou no final dos anos 70, com a luta contra a ditadura militar e o estado de exceção e a construção de um estado de direito e a redemocratização”, explica o escritor e médico psiquiatra Dr. Paulo Amarante, 58 anos, que é mestre em Medicina Social (UERJ) e doutor em Ciências da Saúde (ENSP/Fiocruz).

Em artigo publicado no Jornal O Risco, produzido pela Associação Mineira de Psiquiatria (AMP), a médica psiquiatra Dra. Gilda Paoliello, que trabalha como professora da residência de psiquiatria do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (IPSEMG) e atua como diretora do departamento de psiquiatria da AMP, reitera o papel de destaque que Minas para a reforma psiquiátrica. “Lembremos que o marco da Reforma em Minas foi o III Congresso Mineiro de Psiquiatria, realizado em 1979, sob a égide da AMP e que foi presidido por Cezar Rodrigues Campos. Alguns anos antes, várias vozes já se levantavam denunciando os absurdos acontecimentos ocultos pelos muros manicombiais. (...) Entretanto, o III Congresso introduziu novos olhares, como Franco Basaglia e Robert Castel, que funcionaram como facilitadores para o início de uma subversão do estabelecido”.

Paulo Amarante lembra também que as “denúncias da violência nas instituições psiquiátricas foram elementos importantes neste processo, para revelar bem cruelmente como o estado tratava a saúde mental. Muitos acontecimentos marcam esta época, e para relembrar a importância de Minas, o documentário de Helvécio Ratton (Em nome da Razão) e as reportagens de Hiram Firmino (Nos porões da Loucura), ambos sobre o hospital de Barbacena, são emblemáticos”.

Um ponto histórico que marcou a luta antimanicomial mineira – e que teve projeção nacional, foi a exibição do documentário “Em nome da Razão”, durante o III Congresso Mineiro de Psiquiatria, naquela época, como aponta a professora-doutora e psicóloga social Maria Stella Brandão Goulart, 50 anos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Segundo Maria Stella, que é historiadora da reforma psiquiátrica, um dos motivos que permitiram o documentário ter atingido tantas pessoas foi por conta do fim da censura à imprensa, no período da ditadura militar.

“As coisas aconteceram muito articuladas, do ponto de vista histórico. A ação muito positiva do então secretário de saúde, Levindo Coelho, abrindo os hospitais psiquiátricos públicos à imprensa, a liberação do documentário do Helvécio e a presença do Basaglia – que foi um grande articulador da reforma psiquiátrica italiana, para o congresso mineiro foram pontos que, somados ao debate e conjunto de ações desencadeadas nesse Congresso, fizeram que houvesse um entendimento para que a sociedade se mobilizasse a respeito da importância da luta antimanicomial como conhecemos”, explica Stella que, no final de maio, viajou para Itália, para apresentar um seminário na Universidade Bolonha sobre as conexões entre a reforma psiquiátrica brasileira com a italiana, dando enfoque às manifestações artísticas usadas para o tratamento da doença mental.


Observação: Apesar deste texto ser de minha autoria, ele for originalmente publicado no Portal Minas Saúde, na série de reportagem sobre Reforma Psiquiátrica.






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1 comentários

  1. Que rica essas informações sobre saúde mental, Wander!!! Eu mesma não sabia desse trabalho pioneiro de Minas em liderar a reforma psiquiátrica no Brasil. Reconheço que os esforços são muitos, mas ainda temos muito que melhorar...principalmente no trabalho de conscientização das pessoas para acabar com o preconceito.

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