Café Convidado – Uma visão do outro lado da torcida na estreia do Novo Mineirão
fevereiro 05, 2013
Na seção Café Convidado de hoje, a jornalista Laís Menini fez uma crônica
bastante inusitada: ela que é cruzeirense “roxa” se aventurou na torcida do
Atlético Mineiro por causa do namorado que torce para o Galo e, principalmente,
porque não tinha mais ingresso sendo vendido no lado Azul Celeste do estádio.
Além de relatar o jogo, Laís fala de como foi o comportamento da torcida atlética
e denuncia a falta de estrutura do jogo de inauguração do Novo Mineirão. Abaixo,
confira o texto:
Pós-Jogo Especial:
Relatos de uma “Infiltrada”
*Por Laís Menini
Tenho
um namorado atleticano que amo muito, e para dar um passo a frente na relação
decidimos ver ao jogo no Mineirão
juntos. Só que meu sócio não comprava dois ingressos para cadeiras especiais e,
quando ele foi fazer a compra no Mineirão, descobrimos que não vendia esse
setor por lá. Coisas de novo estádio. Ele na fila, só tinha ingresso para a
torcida do Atlético, e eu no telefone bradei: pode comprar esse aí mesmo.
Minha
expectativa para o domingo era viver uma experiência antropológica muito
interessante, mas desde o pré-jogo a sensação é de que eu vivia meu pior
pesadelo, olhando para o Gigante da
Pampulha, sem vestir o meu manto (por questão de segurança), infiltrada na
torcida adversária. Aconteceu o que eu previa: muita alegria por lá, torcedores
muito confiantes de ver um Atlético fechadinho enfrentando um Cruzeiro
desfalcado, em formação e com muitas caras que nem a torcida conhecia.
Ao
entrar no estádio, vi a cavalaria da PM se aproximando e a torcida eufórica: o
ônibus do Atlético estava passando.
Fiz questão de parar para ver o Expresso
da Paixão e, sem óculos escuros, meter um olho gordo frenético, olhando sem
piscar para cada janelinha que passava em minha frente. Aparentemente, deu
certo.
Ainda
no pré-jogo, vendo minha torcida fazer festa já dentro do estádio, repensei
minha atitude e me arrependi. No reencontro com o Mineirão, gostaria de estar lá daquele lado, mas a vida quis que eu
estivesse do lado atleticano do estádio - e vivesse uma das experiências mais
divertidas de toda a minha vida.
Devo
ressaltar que dei a sorte de encontrar no setor em que estive atleticanos
extremamente educados. Todas às vezes em que me dirigi a algum deles para tirar
alguma dúvida ou pedir para bater uma foto, ou licença para passar, fui muito
bem tratada. E, na única vez que dei uma vacilada, xingando: “Tinha na nossa
área!”. Ninguém ouviu – ou eles fingiram que não ouviram, com muita elegância.
Quando
a escalação foi feita, um placar desfavorável para nós já se desenhava na minha
cabeça. O Atlético estava realmente muito entrosado, até eu já sabia de cor
aquela escalação. No Cruzeiro, não conhecia muita gente. A bola rolava e minhas
mãos tremiam. E o destino fez com que, no primeiro gol nosso, eu estivesse
protegida dentro do banheiro (bebendo água da torneira, diga-se de passagem,
para não morrer de desidratação em um estádio sem bares).
Subindo
as escadas ainda ecoavam gritos de euforia, e meu coração se acalmou quando eu
vi que a parte em que eu estava do estádio não era a que estava pulando. Quando
o Atlético fez o gol, em uma confusão dentro da área de Fábio, a torcida
atleticana pulou, vibrou, cantou o hino e resolveu entoar uma musiquinha que
dizia que o sonho acabou para nós, Libertadores era eles que iam. Engraçado...
eu tinha ouvido exatamente essa música antes, vindo do caminho contrário,
enquanto alguém guardava alguma vaga. Dessa vez eram eles. Paciência.
Achei
que o jogo ia terminar nisso, e já estava com dó do Mineirão. O pior placar
possível em um clássico - ainda mais inaugural - é um empate. Mas a
movimentação do Everton Ribeiro e a avenida aberta por Nilton, em momentos
diferentes do jogo, mostraram quem estava superior. Finalmente via uma dupla de
zaga que estava me enchendo os olhos, e novatos que mostraram ter raça para
guerrear. Começava a acreditar em um desempate.
Quando
Dagoberto estava pronto para entrar em campo, cochichei para meu namorado: em
todos os meus anos de Mineirão, aquele cara tinha sido meu pior pesadelo. Era
entrar em jogo pelo São Paulo que trazia infelicidade para a nossa torcida.
Sorte minha que agora ele era nosso. Não deu cinco minutos da minha confidência
e ele faz a torcida atleticana se calar – dessa vez, até o final do jogo.
Derrubei
um "mito" como infiltrada: a torcida do Atlético Mineiro NÃO APOIA por 105 minutos. Ela se cala quando se
sente acuada. Ela acha que faz pressão gritando músicas de sua torcida
organizada, para ela própria, e entoando que "maria é tudo frouxo".
Cantaram o hino exatamente cinco vezes - sendo duas dela antes do jogo começar.
E não encontraram revide para quando a torcida cruzeirense entoou o segundo
hino alvinegro (a música da Beth Carvalho) e nem quando gritos de
"Kalil" ecoaram pelo Mineirão.
Disseram
que eu ia me arrepiar, e teria falado que me arrepiei se isso tivesse
acontecido. Mas o que eu vi e ouvi nessa torcida são coisas que não me
arrepiaram e não me emocionaram, mas me divertiram muito. O Mineirão estreou
com a vitória do gigante de Minas, que finalmente voltou para casa e, apesar de
ainda ter muito chão a percorrer e MUITA COISA A ACERTAR, nos encheu de
esperança pela garra demonstrada, pela gana e pela raça.
Mas
o próprio estádio tem muito o que arrumar para nos receber das próximas vezes.
Absurdo não terem aberto os bares, vi crianças morrendo de sede sem nada para
beber. Eu estava no anel superior e tive que subir escadas duas vezes, pois me
informaram um setor de assentos que não era o meu. Bato palmas para o
policiamento, já que não vi nenhuma confusão dentro e fora do estádio, e para o
atendimento fora do Mineirão, que foi muito prestativo na busca pelo setor. Mas
ainda há muito o que melhorar para deixar o estádio no tão sonhado "padrão
Fifa".
Já
o estádio, como não poderia deixar de ser, ficou maravilhoso. Entrei em
estádios no Brasil, na Argentina e na Europa e ainda não vi um tão bonito
quanto o nosso. Ao Cruzeiro, a
vitória sempre, e a esperança de que haverá mais jogos com muita raça e
alegria, como esse. A mim, a certeza de que essa foi uma experiência única, da
qual não quero tornar a repetir. E a nós, um chamado importante: TENHAMOS PACIÊNCIA. É só apoiando o
time, a comissão técnica e fazendo críticas construtivas que conseguiremos ver
o Cruzeiro se reerguer para brilhar novamente.
Os
dois gigantes de Minas (Mineirão e Cruzeiro) se reencontram ontem. A partir de
então, é responsabilidade NOSSA que eles possam se manter no topo por toda a
eternidade.
IMPORTANTE:
meu relato é apenas um "conto de aventura", e não tenho intenção de
ofender ninguém, atleticanos ou cruzeirenses, com a minha atitude. Ressalto que
me comportei civilizadamente na torcida adversária, não fiz tumulto ou tive
qualquer atitude para prejudicar o Clube Atlético Mineiro, justamente porque
vejo atleticanos como ADVERSÁRIOS EM CAMPO, e não como inimigos.
Fotos:
Secopa/Divulgação.
_____________________________
*Perfil: Laís Menini, 26 anos, é jornalista,
redatora, cruzeirense e blogueira. Nas horas vagas, se divide entre os estádios
de futebol e suas séries preferidas, que relata no Blog do Cruzeirense
e no Sérieterapia.
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Jornalista
4 comentários
Linda crônica. Mas, o principal é: O que não faz o amor! Parabéns Laís.
ResponderExcluirO que mais gostei da crônica da Laís é que ela serve para quebrar o preconceito que uma torcida possa ter contra a outra. Quantos cruzeirenses já se apaixonaram por atleticanos? Quantos atleticanos tem amigos cruzeirenses? A rivalidade tem que ficar só no campo mesmo.
ResponderExcluirMuito bom o texto da Laís, parabéns. Fui a esse jogo no Mineirão e quase morri desidratado. Da próxima vez que voltar lá vou ter que levar uma caixa de isopor com água e comida, só pode....rs
ResponderExcluirÓtima cronica!
ResponderExcluirApesar de não gostar de futebol, o texto tomou conta de minha curiosidade.
Beijos