Ponto de Vista – O Astro é um tapa na cara na safra atual de telenovelas

julho 16, 2011



Um herói que deixa o público na dúvida se é realmente mocinho ou se está arquitetando mais um golpe na pele de Professor Astro. Com essa pulga atrás da orelha, a Rede Globo estreou o remake da telenovela O Astro, exibida originalmente entre 1977 e 1978. Naquele tempo, a novela foi um verdadeiro sucesso a ponto de parar o Brasil com a famosa pergunta “quem matou Salomão Hayalla?”. Para a versão contemporânea, que foi concebida para festejar os 60 anos das telenovelas no Brasil, a Globo prometeu uma macrossérie em 60 capítulos, inicialmente. 

Depois voltou atrás e resolveu lançar #OAstro como “a nova novela das 11 (horas da noite)”, se comprometendo a estender esses capítulos para 80, caso o remake seja um sucesso. E já é, lógico! O povo comprou essa idéia de novela no fim da noite. Acredito que na próxima semana, #AFazenda4, da Rede Record, terá uma bela concorrente nesta faixa. O bicho, literalmente, vai pegar!

Como telespectador, aplaudo a franqueza da emissora carioca de topar estender a “a nova novela das 11”, pois pela semana de estréia, O Astro retomou um fôlego que foi perdido nas últimas novelas das 9. A história de Janete Clair é popular e tem uma pegada única, como há muito tempo não se via. Como explicar a tensão sexual, pra lá de #HOT, de Herculano (Rodrigo Lombardi) e Amanda (Carolina Ferraz), sem ao menos o casal acontecer de fato? Química dos atores? Trilha sonora perfeita? Bom texto? Tudo. 

A fórmula vai de encontro há algo que foi perdido nas novelas – e que, ao meu ver, a única atual que “pescou” esse lance é Cordel Encantado: enganar o público com elegância. Ou seja, não entregar tudo da trama logo de cara e mostrar que as histórias têm vida, cores e que os personagens podem surpreender a qualquer momento, tanto para o bem, quanto para o mal.

Em O Astro, pelo menos na apresentação inicial dos personagens, esse caráter dúbio das personagens é o mais fascinante. Não há mocinhos, nem mocinhas, sonhadoras água com açúcar. Todos têm o seu lado bom e ruim, assim como na vida. Claro, uns tem mais escrúpulo que os outros, justamente para ser um ponto de referência para o público poder fazer, de modo sutil, a sua comparação. Entretanto, todos ali agem como humanos, o que deixa a ficção com mais cara de realidade. Isso é fascinante, pois obriga o telespectador a pensar probabilidades na trama, que podem vir a acontecer ou não. Instigar é alma de qualquer boa história, repare só!

Outro destaque dessa semana são os atores Thiago Fragoso e Alinne Moraes. Tiago por fazer um Márcio Hayalla sonhador, perturbado pela falta de amor do pai, mas que acredita na humanidade e nas pessoas. A cena dele com o pai na festa, completamente nu, foi emocionante e de uma complexidade como pouco se viu. Ponto para @fragosothiago que deixou o experiente ator e diretor Daniel Filho no chinelo. 

Aliás, Daniel nos dá a impressão de não estar tão bem na pele do figurão e empresário de sucesso Salomão Hayalla. Por fazer um personagem amargurado pelo fato de ter se entregado a vida toda ao trabalho, Daniel às vezes passa um Salomão artificial e robótico, como aquela sátira que o Tom Cavalcanti faz de Roberto Justus...ainda não senti verdade no tom que ele deu a personagem, mas isso é uma impressão pessoal, apenas.

Já Alinne Moraes rouba a cena pela naturalidade de Lili e pelo drama que a personagem dela vive de morar com a mãe na casa do cunhado que “não vale a calça que veste”. Outra cena linda de Lili foi quando ela encontra Márcio Hayalla tocando no metrô: o diálogo dos dois foi poético e de uma beleza fenomenal. Não é à toa que Alinne é um dos grandes destaques de sua geração: ela passa verdade no olhar, como poucas, além de uma beleza singular. 

Apesar dos roteiristas Alcides Nogueira e Geraldo Carneiro, deixarem bem claro que o remake de O Astro é “baseado em uma história de Janete Clair”, eles conseguiram captar a essência do texto da esposa de Dias Gomes: falar do povo para o povo, de uma maneira simples, direta e com muita, mas muita naturalidade. Além disso, a “nova novela das 11” tem uma pegada ótima de série: trama ágil e diálogos mais objetivos. Ponto para os autores!

No mais, acredito que #OAstro é um tapa na cara na safra atual de telenovelas (tirando Cordel Encantado, é lógico...rs) por mostrar que o gênero está vivo e não pode perder a simplicidade, muito menos a criatividade, nem a humildade de reconhecer que as tramas são feitas para público, e não para a contemplação do ego particular dos atores, diretores e autores, como acontece e muito, infelizmente. Logo no primeiro capítulo, uma frase me marcou e sintetiza bem o que falta nas telenovelas atuais: “Todos os seres humanos querem ser enganados, sobretudo as mulheres. Enganar com elegância é a alma do negócio”. 

A frase dita pelo personagem Ferragus (Francisco Cuoco), no remake de O Astro, ilustra bem o quanto a “maga das oito”, Janete Clair, era fera em enganar com elegância o telespectador, de modo a seduzi-lo como uma verdadeira “usineira de sonhos”. Sim, está faltando pegada em muitas das novelas atuais. O telespectador quer ser novamente “enganado”, e não mais subestimado....algo a se pensar, né!




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*Observação: Este artigo faz parte da minha participação na seção Ponto de Vista, do site do Cena Aberta, onde três jornalistas publicam um artigo mostrando pontos diferenciados sobre o mesmo assunto. Todo sábado você vai encontrar artigo escritos por Endrigo Annyston, Emanuelle Najjar e Wander Veroni.








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Wander Veroni
Jornalista

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7 comentários

  1. O título do seu post me atraiu de cara...rs...parabéns pelas análises que faz sobre TV, sempre embasada e sem aquele fru-fru de fã exaltado. Tb gostei de O Astro e espero que a Globo mantenha o ritmo alucinante de acontecimentos até o final...detesto trama molenga e que trata o telespectador como idiota.

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  2. Concordo contigo Wander, O Astro é um tapa na cara das novelas atuais. Gente, não tenho paciência para Morde e Assopra (isso é nome de novela?) e Insensato Coração (aquela Marina é um porre!). Novela boa é aquela que te encanta logo de cara e que vc não tem que ficar esperando no sofá a história acontecer. Eu amo O Astro quando toca Easy....acho que também me apaixonei pelo Professor Astro...que homem é esse? No mais, parabéns pelo blog e pelo artigo.

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  3. O único problema de O Astro é o horário....passa muito tarde, infelizmente. Ainda bem que hoje em dia existe internet....rs. O que mais gostei do remake é a agilidade da história e aquilo que vc falou: coloca o público para fazer prognósticos, ou seja, pensar. Detesto ver novela que trata o público como idiota. O tapa na cara do seu título foi muito correto e isso todos nós telespectadores estamos sentindo. Onde estão os bons roteiristas da nossa era?

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  4. Wander, para variar uma ótima análise. Confesso que estava esperando a sua opinião sobre a nova novela das 11, já que vc a anunciou aqui no blog. Pois bem, eu esperava um pouquinho mais de algumas histórias...eu tava na torcida para um primeiro cap. grande....mas depois que fui assistindo o restante entendi o porque....é aquilo que vc escreveu no início do artigo: colocaram um pulga atrás da nossa orelha. Eu acho que o Herculano está preparando um golpe para cima da Amanda, coitada. #prontofalei #Será?

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  5. É por isso que gosto do seu blog: as suas análises são sempre EXCELENTES! Concordo com tudo o que você falou. Também estou adorando O Astro, principalmente pq o Raj, quer dizer, o Rodrigo Lombardi, esta convencendo bem como Herculano. A química dele com a Carolina Ferraz é perfeita! Aposto que eles vão ter um caso na vida real...rs. "Easy.... I´m easy like sunday morning!"

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  6. Assistir novela hoje, se você tem mais de trinta anos, é um tormento. Lixo, lixo e mais lixo é que se tem na tela. Tramas fracas, personagens que não passam a mínima credibilidade ou profundidade e uma repetição sem fim de clichês. Por isso, essas grandes novelas do passado derrubam qualquer "recordista" de audiência atual. Mesmo quando são colocadas em horários malucos como esse ou quando passam somente na TV a cabo (canal Viva)- como é caso do Rei do Gado que dá mais ibope no canal a cabo do que as novelas do canal aberto.

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  7. O Astro é simplesmente uma boa história, dessas que a televisão deixou de ter ultimamente. Janete Clair era mestra nisso, tanto que o grande Carlos Drummond escreveu, depois do fim da versão original: "Agora que O Astro acabou, voltemos às nossas vidas, que o Brasil está lá fora, esperando".
    E, tranquilamente, vence qualquer uma que está passando atualmente, dá um show em Insensato (que já cansou a Norma e Léo) e os repetecos de Walcyr.
    Portanto, O Astro é simplesmente (por ser simples é que é bom) a melhor novela em exibição. Que os nossos novos autores tenham novas ideias e resgatem o gênero, que não está em decadência, mas apenas na espera por boas histórias. Como as de Janete Clair e Dias Gomes!

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