Reportagem Especial: Pessoas Desaparecidas e uma história da vida real
agosto 22, 2009só morrendo dois"
A frase forte era dita pela mãe de Fabina*, que soube aos 12 anos de idade, por meio de um tio, que não era filha biológica do casal que a criava.
Ela pode ter nascido em Belo Horizonte, Cuiabá, Brasília – DF, Vitória, Niterói, Ilha do Príncipe, Praia de Cassilianos, Aterro do Flamengo, Morro Agudo, Volta Redonda ou em Campo Grande, que foram cidades que ela também viveu durante um tempo. O registro da certidão de nascimento é do Rio de Janeiro, mas, segundo ela, isso não conta, pois Fabiana* foi registrada quando já era um pouco mais grandinha, por volta dos 10 anos de idade.
“Essa é a última vez que falo com a imprensa sobre este assunto por causa do desgaste emocional que a história causa”. Foi com essas palavras que ela topou em conversar realizar essa reportagem para contar um pouco do seu drama que é uma luta para entender quem ela é e onde tudo começou. Além disso, por conta da história dela, nos deparamos com mais uma situação: o sofrimento das famílias que sofrem com pessoas desaparecidas. Fabiana* é uma exceção, pois faz o caminho contrário: ela procura pelos pais. Em Minas Gerais, a história é outra: centenas de mães procuram pelos filhos, num total de 1495 investigações em andamento de pessoas desaparecidas. No Brasil não existem dados oficiais que determinem a quantidade de crianças e adolescentes desaparecidos. Anualmente, sabe-se que, no total de casos registrados na Polícia Civil, um percentual de 10 a 15% permanecem sem solução por um longo período de tempo, e, às vezes, jamais são resolvidos.
Foi no dia da ceia de natal, por volta dos 12 anos de idade, que Fabiana* descobriu que não era filha do casal que a criava. Depois de uma insistência do Tio Zeca, que não era bem quisto pela mãe dela, ela e o irmão, foram passar o Natal na casa do Tio. Ao chegarem na casa do Tio, Regina, a filha dele, que já era mais adulta, começou a brigar com o pai insistindo para que Fabiana* soubesse de toda verdade. O tio contou de forma simples e direta. Na hora, apesar do baque que uma notícia dessa representa na vida de qualquer pessoa, Fabiana* não ligou. Como muitas crianças de sua idade, ela e o irmão só queriam saber da ceia de natal.
Essa natal foi extenso. Durou mais dias do que o previsto. Fabiana* e o irmão passaram um bom período na casa do Tio Zeca. Nesse meio tempo, Regina mostrou um álbum para Fabiana* onde havia a notícia de que ela havia sido seqüestrada. “Era um jornal amarelado, bem velho mesmo. Nela havia a notícia que, supostamente, eu era o bebê que havia sido seqüestrado. Hoje, mais de 20 anos depois, tento lembrar o que estava escrito nele, mas não consigo. Por ser muito nova, na época não dei muito importância. Mas isso foi o ponto de partida para eu começar essa história da busca pelo meus pais biológicos”, conta. Pode ser um missão difícil, mas não impossível.
Fabiana* acredita que as chances de encontrar seus pais verdadeiros são muito pequenas. “Acho difícil. Estamos numa verdadeira agulha no palheiro. As chances são uma e um milhão. A maioria das pessoas que tentam procurar seus familiares tem alguma pista, uma medalhinha, uma cicatriz, uma mancha de nascença. Eu não tenho nada disso. Só sei dessa história truncada. Pelo que já conversei com os médicos, a pista que tenho é que, provavelmente, meus pais tenham olhos claros, verdes ou azuis, pois todos os meus filhos possuem essa herança hereditária. A família do meu marido ninguém têm olho claro. Meus olhos são verdes escuros, só quem me conhece muito bem, nota. Essa é uma pista desse gigantesco quebra-cabeça”.
No início, até por não querer se expor e ter uma vida constituída, Fabiana* ficou com receio. Depois de conversar com Dra Cristina e ver que a história dela, ao ser divulgada de forma íntegra, poderia confortar outras pessoas que sofrem desse mesmo problema, Fabiana* topou. “Só Deus sabe o quanto voltar no passado já me machucou. Já passei por vários testes de DNA e todos eles não deram em nada. Quem sabe se essa história terá um desfecho interessante: que alguém que leia possa contribuir com algum pedacinho deste quebra-cabeça. Os grandes autores falam que não existe crime perfeito, quem sabe? A minha chance de ter o caso solucionado é uma em um milhão. Só de poder ajudar no conforto de alguém que vive esse drama de ter um familiar desaparecido, já é um passo importante. Quantos pais passam por isso e sonham rever o filho algum dia? Como mãe, possa falar que saber que o filho já está bem é confortante”. E assim Fabiana*segue a vida. Vida essa que, de uma maneira ou outra, ajudou ela ser quem é hoje: uma mulher guerreira.
Ornella, teve que criar esse nome fictício por ser ameaçada por vários pessoas na internet, quando usava o seu nome real. Ela coordena o site Pessoas Desaparecidas que já ajudou muitas mães a reverem os filhos, na capital carioca. Inclusive ela é uma das militantes da ONG Mães da Sé. “O que as pessoas não sabem é que existe uma quadrilha especializada em tráfico de órgão que aproveita as fragilidades da nossa legislação para atuar. Muitos casos de crianças desaparecidas acontecem por isso, além do fato da exploração sexual e da pedofilia dentro de casa”, revela. Dos quatro ao nove anos de idade, Ornella foi vítima do tio pedófilo, dentro da sua própria casa.
A iniciativa de Nicholas, que foi criado em outubro de 2007, repercute até hoje e é aplaudida por milhares de internautas. Outro ponto desse ato de solidariedade é que os sites criados para cadastrarem desaparecidos e auxiliarem esse tipo de buscam inibem que os familiares tentem encontrar pessoas, pois há muitos dados e exigências impossíveis de serem preenchidas, em alguns casos. Se pegarmos o exemplo de Fabiana*, ela não consegue se cadastrar para procurar os pais por não saber como eles são fisicamente, muito menos os seus documentos. Em contrapartida, os idealizadores destes sites como o Desaparecidos MG, Busca de Pessoas Desaparecidas e CNPD - Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas argumentam que são com esse tipo de mecanismo é possível encontrar pessoas e, inclusive, inúmeras pessoas já foram encontradas.
*Fabiana é um nome fictício da personagem contada nesta história. Por motivos pessoais, ela não quer se identificar.
Essa semana eu volto com mais Café com Notícias.
Wander Veroni
Jornalista
13 comentários
Que matéria espetacular, em nosso pais e no mundo existem milhares de pessoas que passam por este problema, o 0800 depois de criado nos deu meios mais precisos para as buscas e pelas estatisticas apresentada, tem se mostrado muito eficaz. Parabéns nota 10.
ResponderExcluirAbraços forte
Parabéns pela brilhante reportagem, Wander! É uma ferida grande e que muitos evitam tocar.
ResponderExcluirAbraços
Parabéns. Adoro sites úteis como esse. Li a história inteira, muito intrigante e arrisco-me a dizer interessante. Achei incrível a notícia. Beijos
ResponderExcluirQue pauta é essa Wander? Simplesmente...sensacional!
ResponderExcluirO drama de Fabiana deve ser mesmo, muito mais comum do que nós imaginamos. Milhares de "Fabianas" vivem a mesma realidade. Porém, não nos atentamos ao fato, até que aconteça com alguém próximo a nós.
Espero sinceramente, que este blog consiga auxiliá-la nessa busca. Não deve ser fácil viver na incerteza e não saber a origem da própria vida.
É isso aí! Mais uma vez o Café com Notícias divulga algo, em benefício da sociedade.
Parabénss!
Oi Wander.
ResponderExcluirEstou sem net.
Justamente nas festividades do Café com Noticias não estou podendo acompanhar os brindes.
Sinto falta de estar aqui e em outros blogs queridos para comentar, mas daqui a pouco volto!!!
Beijos
Oi, Rê!
ResponderExcluirQue chato, hein! Estou aqui torcendo pela sua volta à blogosfera, viu! É muito ruim ficar sem internet, né!
Beijos :D
Olá Wander, venho anunciar que tem um selo esperando por você lá no meu blog Antenado!
ResponderExcluirUm abraço!
Muito bom o seu blog (de verdade)...
ResponderExcluirOlha, essa questão é realmente uma ferida da nossa sociedade, é triste dizer mais existem tantas "fabianas".
PARABÉNS!!!
:)
Abraços.
Adorei esta matéria, muito bem escrita!! Parabéns
ResponderExcluirExcelente reportagem Wander !
ResponderExcluirParabéns pela sensibilidade e ética jornalística
Abraços
Mário Augusto
Veja em meu blog:
Busca e cadastro de pessoas desaparecidas:
http://alagoasreal.blogspot.com/2009/10/busca-e-cadastro-de-pessoas.html
MDP Search : Busca por mortos , desaparecidos políticos e direitos humanos :
http://alagoasreal.blogspot.com/2009/10/mdp-search-busca-por-mortos.html
Gostei muito desta matéria.A luta de Fabiana*é realmente comovente e muito emocionante.Espero que ainda tenha a felicidade de encontrar os pais biológicos.Ao mesmo tempo fico imaginando como seria emocionante reencontrar meu irmão gemeo,que saiu de casa a uns 30 anos atraz,após uma discussão com meu pai.Especialmente para minha mãe,aos 70 anos seria muito emocionante.
ResponderExcluirOi sou responsavel pelo site http://www.acharpessoas.com/ e achei este artigo sensacional e muito comovente, Depois de passar por esse problema na pele e não encontrar muita informação a respeito resolvi por criar este site, realmente recebo milhares de email de pessoas pedindo para ajudar a procurar pessoas todos os dias, sinto que não tenho como ajudar mais mas fico contente e ver outros sites que disponibilizão informação a respeito. Parabéns
ResponderExcluirNossa, otimo artigo Wander!
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